segunda-feira, 22 de março de 2004

Software no Brasil

Hoje eu vou contar uma pequena história.

John, um jovem programador está cansado da sua empresa. Acabou de sair de uma reunião de cronograma onde ouviu pela n-ésima vez (sendo n um número natural arbitrário) frases como “não quero pressionar vocês, mas minha confiabilidade ficará abalada com os clientes se eu atrasar novamente a previsão de entrega, então me entreguem até o final do próximo mês ou eu vou cancelar o projeto”. Finalmente surge uma oportunidade de ir trabalhar em outra empresa. Vai para a entrevista, dois dias depois é chamado. “Aqui nós trabalhamos com uma relação de empresa para empresa”, diz August, o dono da pequena empresa de software para Web, “como os encargos serão menores eu posso te pagar mais, é melhor para os funcionários!”. Então John ouve, pensando nos problemas dos quais pode se livrar, sobre como a empresa é nova, como tem potencial de crescimento e como quer crescer com os funcionários. Então contabiliza o seu salário inicial com a participação nos lucros que a empresa terá quando o atual projeto for entregue, e conclui que vale a pena trabalhar na empresa. Alguém sabe como esta história termina? Se você vê a realidade do trabalho no Brasil em um escritório barulhento então seu nome aqui é John.

Bem, John. Eu sei o que você sente. Eu acabei de sair de uma reunião de cronograma também. Muito bom..., ótimo. Mas, vamos falar de você.

Você se pergunta: Será que existe alguma boa empresa para se trabalhar neste país?

Bom, é difícil responder. (Vou falar uma coisa óbvia na próxima frase). Existem coisas grandes e pequenas.

As empresas pequenas contratam seus funcionários pagando salários baixos, prometendo participação em lucro após a conclusão do atual projeto. O atual projeto demora mais que o dono da empresa pensava, o cliente perde a paciência, pressiona o dono da empresa que pressiona o programador, que sempre se chama John. John é perfeccionista, às vezes ao excesso. A empresa pede ao John e ao resto da equipe para desligar o seu prefeccionismo para concluir a versão um do software. Depois o cliente vai querer aqueles recursos que foram cortados, o que vai dar tempo para melhorar o código com calma (prognóstico: falência de projeto). Mesmo com o perfeccionismo desligado o projeto atrasa. Então ou o projeto é cancelado e o dinheiro tem que ser devolvido (prognóstico: falência de empresa) ou o projeto é entregue de forma não funcional. No segundo caso, se gasta um tempo equivalente ao tempo do desenvolvimento do software para corrigir bugs. Se o projeto terminar o projeto seguinte leva a falência da empresa. A única coisa que pode impedir isso é um contrato com o governo.

Empresas grandes têm muitos funcionários bons, muitos ruins. E tem contratos com o governo. Em geral duram tanto quanto conseguirem manter os contratos com o governo.

A realidade é que as empresas brasileiras não têm dinheiro para gastar com informática. Não tem opção de gastar com qualidade. E claro que existem exceções. Essas exceções dão dinheiro para algumas empresas grandes e, eventualmente, uma quase gorjeta para empresas pequenas. Se você quer abrir uma empresa você não pode depender de contrato com estas empresas. Na verdade pode, mas é arriscado. Para manter uma empresa é preciso ter ou o governo como cliente (evitando governos estaduais) ou um contrato muito bom com um banco. O problema com os bancos é que eles podem mudar o que bem entenderem e pagar o que for necessário. E você não vai querer ser empresa de um cliente só neste caso.

No final das contas as possibilidades de uma empresa pequena sobreviver no nosso mercado brasileiro são muito pequenas. Dependem mais de sorte do que de qualquer tipo de capacidade técnica ou administrativa. Eu fiz várias generalizações exageradas, mas isso ainda representa bem a situação do nosso mercado. O nosso mercado simplesmente não pode pagar por desenvolvimento de software. Se você tem uma empresa e quer contratar alguém para desenvolver alguma aplicação customizada, eu vou te contar um segredo: Custa mais do que você pensa e leva mais tempo do que você pensa. Os teus processos provavelmente se encaixam em algum software pronto. Se não se encaixam, então repense seus processos. Você os criou e não quer mudar? Então sinto muito te informar, mas isso é um orgulho que vai te custar uma boa quantidade de dinheiro e vai te levar a um projeto falido de software ou a um software extremamente precário ou, caso você esteja realmente disposto, um bom projeto e muito mais dinheiro do que você pensava.

Assim é a vida, pobre John...

quinta-feira, 18 de março de 2004

Chamada para Leitores

Olá todos. Eu sou Francisco Kurpiel. Sou um estudante e desenvolvedor de software fascinado por tecnologia e por várias áreas do conhecimento. Muitas vezes eu pensei em começar a escrever informalmente para público aberto sobre vários assuntos, mas sempre me apoiei na bengala do desconhecimento de meios para fazê-lo. Curioso para uma pessoa que trabalha com tecnologia. Mas agora aqui estou eu com uma caixa de texto e um monte de idéias prontas para pularem para fora através dos meus dedos.

Eu pretendo me focar em reportar a maneira como eu vejo as coisas, o mundo, as pessoas. Eu sei que nós vemos tudo isso de maneira pessoal. Na verdade este é um dos motivadores da minha iniciativa. Uma coisa que eu gosto muito de fazer é conhecer opiniões pessoais de algumas pessoas que eu respeito muito. Quando eu leio uma opinião que é exposta de forma lúcida, clara, bem embasada, eu sou estimulado a pensar sobre a minha opinião a respeito. Isso reforça minha maneira particular de pensar e reforça a base das minhas idéias.

Eu estou escrevendo tudo isso logo no meu primeiro post por que tenho amigos que já se manifestaram negativamente a respeito de blogs (oi, Fábio). Espero que este não seja um motivo ninguém ignorar meus textos.

Eu pretendo fazer posts regulares e vou ficar feliz em receber retorno dos meus posts de todos os que tiverem vontade de responder. Agradeço pelo interesse dos que estão me lendo e convido todos a me escreverem, inclusive os que não me conhecem pessoalmente.